QUANDO UM POEMA NASCE
O poema emerge muitas vezes
Do olhar que acompanha o voo
De um singelo passarinho
Mesmo sem saber
Aonde aquele pequenino ser
De tanto encantamento irá pousar
Pode surgir também do nada
Da total falta de assunto
Dos temas encobertos de agonia
Das horas de amor e de alegria
Ou da tal vontade de se ver nas palavras
Ou de se esconder no meio delas
Sem pudor algum
Ah, o poema pode estar na lua
De qualquer noite
No sol
De qualquer dia
Na chuva
Na rua
Na cama
Hum...
O poema pode estar sim entre os lençóis
Da forma mais depravada possível
Por que não?
Quando um poema nasce
Não há festa de comemoração
Não há parabéns
Nem tapinha nas costas
Há silêncios...
É como se algo misterioso fosse desvendado
Mesmo deixando muitas dúvidas
Pairando no ar
Ou nos versos de outro poema
Que já começa a se formar
De novo???
Assim a história continua
Não tem discussão
O poema impõe sua presença
Desconstruindo a zona de conforto
Adentrando as profundezas do íntimo
Com o álibi mais que perfeito
Achou pesado?
Nem adianta questionar
Que o poema não precisa de argumentos
Só de sentimentos
Não importa qual será a personagem
Nem se fará sentido no final
Se um poema deitar na sua rede
Não se apavore
Acorde, respire
Abra bem os olhos
E receba o que te foi ofertado
Deixe chegar lá no fundo
Mas se preferir pousar lá fora
Acomode-o do mesmo jeito
Depois de uma boa dose de carinho
Escute como se fosse música
Distribua como se fosse refeição
Cumpra como se fosse promessa
Reze como se fosse oração.
...
Ilustração: Eduardo Kingman