DIA, NOITE E DIA
Entre o dia e a noite
uma lágrima se esconde
na fogueira
do coração
uma criança sorri
e desfaz o deserto
da alma
Entre a noite e o dia
o vermelho da alvorada
anuncia
o segredo contado
na leveza das nuvens
NA LINGUAGEM DAS ÁGUAS
Na linguagem das águas
encontrei um mar
de descobertas
traduzi o silêncio
dos peixes
renasci oceano
num extenso continente
escondido
JANTAR
Deixo-me entrar
na morada
em que teus olhos descansam
Invento portas e janelas
entre paredes nuas
desejo o corpo da noite
atravessando nossa paisagem
Assim, entrelaçados
somos concha
em movimento
gosto agridoce na boca
jantar servido
com requinte
BALAIO
Trago
fogo
folha
e flor
medo
música
e mel
dúvida
desejo
e dor
casa
corpo
e céu
brisa
boca
e beijo
sonho
semente
e sal
asa
amor
e agonia
pedra
porto
e poesia
O que queres de mim?
PASSEIO
Caminho
em segredo
na rua
de asfalto
trepidante
buzinas
invadem
os tímpanos
nesse momento
observo
um pássaro
no galho
em profunda
meditação
o dia
precisa
de tempo
e dureza
assim como
a pedra
que se move
no chão
SONHO
Rasga
no céu
o canto
livre
de pássaro
meu peito
abre fenda
e deixa
existir
um coração
fora
do ninho
Sustentável
escorre
pelo dia
vontade
fixa
de ser
vento
no silêncio
das folhas
e do poente
ALPINISTA
Ao fim da noite
o corpo segue como um alpinista
das grandes alturas
a carne gelada sangra no cume
o gelo ainda não derreteu
subir embriagado de luz
pareceu uma suave aventura
se ver lá embaixo novamente
um ríspido equívoco.
SER POEMA
Quem me dera saber do poema
o que ele já sabe de mim
Quem me dera fazer do poema
eternidades
IMPROVISO
Há sempre o momento certo de saltar.
Como saber se o certo momento chegou
quando não se tem a certeza
do tempo claro
nem a promessa
de abrir o paraquedas?
É só mirar na empáfia
daquele que escreve o roteiro
mas prefere o improviso.
ALTITUDE
Deita-me assim
como quem flutua em ondas de mar
Ama-me então
no trânsito inconstante das estrelas
Acredito ser montanha
agora descobre tuas asas
PARA FORA
O impulso arremessa o medo
de ser impuro
para os puros de conduta
Fora da destreza,
do pulso cambaleante e
do olhar leviano
Um coração bate soberbo,
límpido
e vermelho