VOO SOLO
É tempo de voar para dentro
A procura do que ainda
Não foi descoberto
Um voo sem asa
Sem pouso
Sem direção
Para decolar é preciso
Ventar-se!
Mergulhar o corpo inteiro
Nas profundas entranhas
Do próprio deserto
Escutar o eco da alma
Numa viagem cansada
De anoitecer
É como um relampejo
Na janela embaçada
Ou gritos de mar
Encharcando um barco à deriva
Parece perigoso
Isso de querer sangrar em silêncio
De remover as pedras
Com um sopro sutil
Cabem também nesse voo
Chuva de temporal
Turbulências em profusão
E a luz amena de outono
É tempo de voar para dentro
Mas, é sempre bom lembrar,
Para decolar é preciso
Ventar-se!
...
Ilustração: Aldemir Martins